domingo, 10 de fevereiro de 2013

antes da floração








Sabias, se me escutasses, que aguardo o verão com a ansiedade do guerreiro na hora da batalha ou o desassossego da adolescente antes do grande encontro; como se tivesse estado de joelhos, durante toda a noite, atenta ao murmúrio do oráculo e fosse agora o momento de desvendar o enigma.



Sabias, se me adivinhasses, de uma existência mais do que escrita nas folhas de um caderno ou de um palavrear de insatisfação em linhas curvas; como se as palavras fossem eu e quisessem vida depois de anos amarradas aos cabelos da esfinge, exposto agora o desejo à nudez do amanhecer.



Sabias, se me visses, da força dos rebentos em vésperas da floração, ou da energia de uma estrela mal pousada no espaço, a querer abraçar a terra; como se o romance não tivesse ainda começado mas o seu halo já pairasse por cima da pose inquieta e do fogo a arder nos lábios.




Folhas de outono




Não é por não te ter… é mais pelo castanho-velho das folhas que o vento empurra pelas ruas e pelo calor húmido que o ar carrega entre portas, onde o sossego exagera de tanto ser por fora e a inquietação por dentro.

Não é por não te ter… é mais pela crueldade diária do vazio dentro da masmorra sem janelas; pelo pó que se acumula na parte de cima dos livros fechados; pela marca dos passos no mármore do chão; pela tinta que se vai gastando de tanto esconder o branco dos cabelos.

Não é por não te ter… pois ter-te seria um excesso, a todas as horas, no desassossego da invenção das noites mal dormidas.

Não é por isso, não. É pelo espaço reproduzido no vazio, pelas horas que o relógio multiplica, pela constância do silêncio a prolongar-se na mesma direcção, pelo sentido obtuso da conversa unilateral, pela música sem eco no canto da sala, pelo excesso de sossego em vez da festa, pelo desejo mal arrumado no canteiro adiado da sementeira, pelos laços quase desfeitos de tanto enrolar o inexplicável, pelas palavras que ditas, outrora, seriam ouro e escritas, agora, ganham um peso inútil.

Não é por isso, não. Ter-te, à distância, seria ainda esperar a ternura do carinho preso aos dedos e a esperança de não definhar calada.